Quando falamos de crianças, com pais ou profissionais que orientam o seu desenvolvimento, apercebemo-nos que o foco do adulto está frequentemente direcionado para o comportamento da criança e para a normalização do comportamento que exibe. Será esta a atitude correta?
Muitas vezes olhamos para os comportamentos das crianças como desajustados face àquilo que parece ser o padrão estipulado pela sociedade e, não raras vezes, o objetivo passa pela extinção desse comportamento através da manipulação da criança com recurso frequente a castigos, time outs, prémios e recompensas. Estas estratégias, frequentemente utilizadas em estilos de parentalidade mais tradicionais, assentam em teorias comportamentalistas que tendem a obter resultados imediatos ao nível do controlo do comportamento numa situação específica e que transmitem à criança uma ideia de amor e reconhecimento, dependentes e condicionados pelo seu comportamento. Muitas vezes estas estratégias originam stress e sentimentos de insegurança que colocam em causa o desenvolvimento de uma autoestima saudável.
Entender a origem dos comportamentos
Muitas vezes queremos extinguir determinado comportamento sem antes tentarmos compreender o que está na sua origem. Um foco mais orientado para o motivo que perpetua determinado comportamento poder-nos-á auxiliar numa tomada de decisão mais consciente e saudável, face ao desempenho da criança em determinada situação. Quando este é o nosso foco, apercebemo-nos que, por detrás de um comportamento visto como desadequado, se encontra uma criança com uma necessidade, que apenas tenta comunicá-la usando as ferramentas que dispõe e que, muitas vezes, se apresentam na forma de birras e comportamentos opositores.
Estas necessidades podem ser físicas ou, na maior parte das situações, emocionais. As birras estão frequentemente associadas à necessidade de conexão com o adulto, à necessidade das crianças de se sentirem seguras e amadas, à necessidade de se sentirem compreendidas e à necessidade de saberem que o amor que nutrem por si é incondicional. Se olharmos para o comportamento da criança através da sua perspetiva, rapidamente conseguimos perceber que a solução está na relação. Se prestarmos atenção aos motivos que despoletam determinado comportamento, podemos agir de forma a suprir as necessidades desta criança, através do reconhecimento, da compreensão e da compaixão.
Compreensão – o elemento chave
É importante clarificar que a satisfação das necessidades das crianças não implica atender a todos os seus desejos, ou o não estabelecimento de limites. Implica, sim, compreender qual foi a necessidade que motivou os seus desejos e de que forma o adulto poderá fornecer uma resposta saudável que permita suprir as suas e as necessidades da criança.
Imaginemos, por exemplo, uma criança que não quer tomar banho sozinha. A tendência do adulto poderá ser utilizar argumentos como “já és crescido, tens que tomar sozinho”, “o teu irmão e os teus amigos tomam banho sozinhos”. Podem, inclusive, ser utilizadas outras estratégias comportamentais como tabelas de recompensas que poderão atingir, num curto prazo, o comportamento desejado, mas que não permitirão à criança experienciar de uma forma positiva e construtiva os seus receios e inseguranças, nem aprender a expressar suas necessidades. Desta forma, embora o comportamento possa extinguir-se, poderemos estar a condicionar o desenvolvimento da sua autoestima e a negligenciar o seu papel no seu próprio processo de desenvolvimento. Ao invés de assumirmos apenas que a criança tem que o fazer, faz sentido questionarmo-nos sobre o motivo que a leva a não querer realizar essa tarefa sozinha: esta criança poderá ser insegura quanto ao seu desempenho/resultado; poderá ver no momento do banho um momento de conexão com o cuidador e sentir-se desconectada na ausência desse momento no seu dia. Se olharmos para a situação do ponto de vista da criança, talvez possamos adotar comportamentos mais ajustados a ela e que satisfaçam também as necessidades do adulto. Estes comportamentos passam muitas vezes por usar os momentos de birra como um momento para nos reconectarmos com a criança, demonstrando-lhe compreensão, compaixão, segurança e amor incondicional.
Artigo originalmente publicado na primeira edição da Revista De Mãe para Mãe
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